Por Davis Sena Filho — Palavra
Livre
O
senador Marcelo Crivella (PRB/RJ) aprovou projeto de lei no Senado e que se
transformou na Lei nº 13.060/14, pois sancionada pela presidenta Dilma
Rousseff, que determina que a atuação das polícias brasileiras tem de ser
baseada nos princípios da legalidade, da necessidade, da razoabilidade, da
proporcionalidade, a priorizar sempre o uso de equipamentos com menor poder
ofensivo.
Na
verdade, a Lei sancionada, em dezembro de 2014, disciplina o uso de armas
letais e não letais por agentes de segurança pública, ou seja, o Estado é
obrigado a oferecer aos seus agentes as armas não letais, além de propiciar
cursos de capacitação e formação para que os servidores possam usar os
equipamentos e ferramentas adequadamente, bem como o indivíduo que foi ferido
por essas armas seja socorrido e sua família prontamente avisada do ocorrido.
O
Brasil, infelizmente, é um País pródigo em assassinatos, repressões policiais
ilegítimas e com força excessiva, bem como em chacinas, que representam, sem
sombra de dúvidas, o lado mais demoníaco do ser humano, que se transforma em
um ser bestial e aplica sua punição a seu bel-prazer, a se locupletar com seus
interesses, que, definitivamente, não o são os da sociedade brasileira, que
apenas deseja trabalhar e viver em paz.
A
verdade é que as polícias deste País injusto foram criadas ainda no Brasil
Colônia e consolidadas no Brasil Império. Trata-se de corporações policiais
portadoras da ideologia da caça, porque foram criadas, treinadas e doutrinadas
para proteger os patrimônios e os interesses dos senhores de escravos, bem como
reprimir com extrema violência os cativos que não cumprissem com suas
obrigações, se rebelassem ou fugissem das fazendas e senzalas por não aceitarem
a condição de escravo e as violências das quais eram vítimas.
Não
é de hoje que temos uma sociedade racista, excludente, sectária, elitista e
violenta. Nada na vida é à toa. Tudo tem um por quê. E o nosso problema é
porque não tratamos, de maneira adequada e inteligente, dos escravos que se
tornaram oficialmente “cidadãos”, após o fim da escravatura, mas não obtiveram
as condições de logística e de empregabilidade para tocarem a vida, o que
significou o abandono de milhões de pessoas, que passaram a ocupar os guetos,
as periferias e os morros — as chamadas comunidades, termo que tenta amenizar e
esconder, hipocritamente, a palavra favela.
Por
causa dessas realidades mórbidas e sórdidas que temos uma sociedade fria e dura
quanto às questões sociais, principalmente no que é relativo aos sentimentos
sectários e de classe enraizados nas classes médias e ricas, no que concerne às
suas naturezas brutais, que é o de aceitar, e mais do que isto, ser cúmplice da
violência e da concentração de renda e de riqueza que sempre aconteceu no
Brasil, apesar dos esforços dos últimos governos trabalhistas, a partir do ano
de 2003.
Porém,
a lei de autoria do senador Marcelo Crivella impõe restrições ao uso de armas
de fogo por parte das polícias, porque a matéria visa, sobretudo, ter um
controle social sobre o sistema de segurança, a lhe dar limites e a
civilizá-lo. Somos um País que foi colonizado por europeus e temos uma
democracia consolidada, apesar das crises políticas e econômicas, artificiais
ou não.
Entretanto,
apesar de a nossa sociedade se espelhar nos valores e princípios europeus,
admirar a organização dos países dominantes da Europa (Inglaterra, Alemanha e
França), sabemos que temos uma elite, inquilina da casa grande, que apenas quer
usufruir do País, ganhar muito dinheiro aqui, aproveitar-se da mão de obra
barata, bem como passar as férias no exterior e mandar seus filhos estudarem
nas melhores escolas e universidades europeias e norte-americanas.
Não
é fácil, quando uma pessoa tem discernimento e conhecimento das realidades que
se apresentam a ela e rapidamente verificar que, na verdade, temos uma classe
dominante que odeia e despreza o País e, consequentemente, não deseja que o
povo brasileiro se civilize, se liberte e, definitivamente, torne-se emancipado.
Eu
quero dizer que os sistemas de segurança e as classes abastadas, que controlam
e dominam os meios de produção, de comunicação e informação o são cúmplices e
responsáveis pela violência no Brasil, especialmente as corporações policiais,
que, como afirmei anteriormente, transformam-se em capitães do mato dos tempos
da escravidão, porque são treinados e ideologizados para, primeiramente,
defender o patrimônio privado, os interesses empresariais e combater os
movimentos sociais, dos trabalhadores, dos índios, dos favelados, dos sem
terra, dos sem teto, dos gays, dos negros, das mulheres trabalhadoras e pobres,
bem como tudo aquilo que possa atrapalhar os negócios da grande burguesia.
A
burguesia que tem o apoio, quase irrestrito, da pequena burguesia — a
considerada classe média, que saiu às ruas ontem e mostrou, mais uma vez que é
antidemocrática, que não se importa com a democracia e muito menos quer saber
dos avanços sociais conquistados pelo povo brasileiro nos últimos 13 anos.
Tanto o é verdade, que não vi as pessoas desses movimentos apresentaram uma
pauta de reivindicações sociais e defenderem as conquistas econômicas do povo
brasileiro. São fatos reais, independente do quaisquer opiniões política,
ideológicas e de classe.
Por
isto acredito que a Lei 13.060 vai cooperar, e muito, para que o Brasil se
civilize e se torne um lugar de paz, solidariedade e prosperidade. A Lei, que
vigora, tornou ilegal o uso de arma de fogo contra pessoa desarmada em fuga ou
que não represente risco imediato à vida dos policiais ou dos cidadãos, que
podem estar presentes em pleno tiroteio nas ruas.
É
considerado também ilegal pela Lei os disparos contra veículos que desrespeitem
bloqueios policiais, a não ser se a integridade de agentes ou de terceiros seja
posta em risco. A Lei exige ainda que os policiais sejam treinados a usar
instrumentos projetados para não causar mortes ou lesões permanentes, e
disponham deles quando em ação.
Para
quem não sabe a fonte de inspiração de Marcelo Crivella para elaborar uma Lei
de amplitude tão social e civilizatória foi o Código de Conduta para Policiais,
proposto pelas Nações Unidas e adotado com êxito em muitos países. Enquanto a
Lei não for realmente obedecida pelos agentes públicos dos órgãos de segurança,
ficaremos a nos perguntar: Quantas dessas mortes poderiam ter sido evitadas?
Quantas delas decorreram de despreparo, precipitação e sentimento de
impunidade?
A
verdade é que a polícia brasileira mata muito. A morte está em seu DNA
histórico, de essência escravocrata, e com a aquiescência das elites que
controlam a política e a economia. Engana-se aquele, por ignorância ou má-fé,
que o povo reprimido e sem acesso aos benefícios oferecidos pelo Estado, aos
bens de consumo e à educação não tem meios de reagir, mesmo quando de forma
criminosa. Para tudo se paga um preço e o preço do Brasil é altíssimo, porque
se recusou a distribuir renda e riqueza no decorrer dos séculos. Depois vem a
conta e ela é amarga.
As
mortes por conflito armado são aos milhares. Geralmente as vítimas e até mesmo
os algozes são pobres, jovens, negros e moradores de comunidades. Ninguém toma
as dores quando esses brasileiros morrem. A frieza é absoluta e o desdém chega
às raias da loucura, porque só pode estar mentalmente fora de si o sujeito que
não se importa em viver num lugar deflagrado por uma guerra sem fim, pois
desprovido de sonhos, de realizações e de esperança por dias melhores.
O
monopólio da violência pertence ao Estado. Todavia, não lhe é assegurado o direito
de matar impunemente. Existem regras e restrições duras àquele que abusa do
poder em relação à sociedade civil — ao cidadão. Vivemos em plena democracia e
o Estado de Direito não permite agressões, repressões e assassinatos por parte
de policiais, que são indivíduos subordinados a regras, normas, regimentos
internos e estatutos, além de serem submetidos aos códigos Civil e Penal, bem
como à Constituição.
Não
existem dúvidas quanto a isto. Outrossim, não é mais possível se tolerar que
policiais matem jovens que fogem de abordagens. E explico: independente de
qualquer objetivo e determinação por parte dos chefes de corporações policiais
ou de governantes mais radicais, servidores públicos, armados, não podem e não
devem matar uma pessoa porque ela se tornou uma “suspeita”. De forma alguma. Um
jovem, por exemplo, independente se ele for morador de comunidade pobre ou de
bairro rico, não pode ser morto, se ele não agrediu a polícia por intermédio de
arma de fogo.
Jovens sentem medo por serem
visados, pois estão sempre nas ruas, fazem barulho, são geralmente agitados e
impulsivos e não tem experiência de vida. Sentem
medo e fogem quando avistam a polícia, por saberem que ela é violenta,
culturalmente gosta de bater e humilhar, além de matar. Evidentemente que não
generalizo, Existem inúmeros bons policias e que se subordinam aos códigos de
ética e de boa convivência com a sociedade. Mas a questão que está a ser
discutida é a violência policial, que geralmente atinge, em cheio, os pobres,
os jovens e os negros.
Incontáveis
mortes de autoria de policiais as vítimas foram perfuradas por balas pelas
costas e na nuca. Olhem o exemplo da chacina recente em São Paulo quando 18
pessoas morreram e outras estão nos hospitais. Uma noite e madrugada de
horrores. Em pleno século XXI do terceiro milênio ainda temos no Brasil grupos
armados e que atuam clandestinamente a matar pessoas, a chaciná-las e a levar
pavor à sociedade, que não consegue viver em paz, porque assassinos resolveram
fazer guerra ilegal por motivos que, certamente, não são nobres e muito menos
respeitadores das leis.
A
maioria das vítimas era pobre e negra, bem como não tinha passagem pela polícia
e não respondia processo na Justiça. Um País jamais vai ser civilizado quando
grupos armados se mobilizam para assassinar pessoas porque se sentiram
insatisfeitos ou prejudicados e por isto resolveram fazer uma inconcebível e
satânica vingança.
O
Brasil pertence à sociedade civil, às famílias e aos trabalhadores — às pessoas
de bem que querem um País solidário e democrático. Os governantes, os
mandatários, as autoridades tem de se mobilizar para coibir duramente àqueles
que incorrem em crimes e não respeitam as leis de uma sociedade que deseja, e
muito, ser civilizada e desenvolvida.
A
violência policial é o sintoma de que a sociedade está doente e precisa se
tratar. Ninguém comete violências sem a aquiescência e a cumplicidade de certos
grupos dominantes e de parte de uma classe média que se alia aos interesses
desses grupos. A violência é o horror personificado na forma diabólica do
Estado com a cumplicidade de certos setores da sociedade. A violência policial
está intrinsecamente ligada à escravidão. É isso aí.
2 comentários:
Do espetacular jornalista Davis Sena Filho:
“Os governantes, os mandatários, as autoridades tem de se mobilizar para coibir duramente àqueles que incorrem em crimes e não respeitam as leis de uma sociedade que deseja, e muito, ser civilizada e desenvolvida.”
obs.: - o gov/PSDB/São Paulo – há mais de 20 anos – fez e faz exatamente ao contrário: no planeta, SP é o único lugar no mundo, onde o crime organizado é dirigido – pelo pcc - ‘dentro’ da cadeia;
- e, também, é o único governo que faz acordo com o crime organizado (estadão/27/07/2015)
- e, mais ainda, o engavetador alckmin: jornal da band – 27/03/2012 denunciou que relatórios secretos feitos pelo DHPP, que pediam investigações sobre policias militares envolvidos com o crime organizado, foram engavetados no governo alckmin;
- e, para encerrar, IG – 23/05/2013 - PCC comanda, além dos presídios paulistas, os crimes nas ruas das cidades paulistas a partir da penitenciária de presidente venceslau (sp), afirma socióloga Camila Caldeira Nunes dias, da USP, mostra que o governo de São Paulo vem sendo derrotado pelo crime organizado.
Concordo plenamente contigo Davis:
“O Brasil pertence à sociedade civil, às famílias e aos trabalhadores — às pessoas de bem que querem um país solidário e democrático”
É uma pena que em SP seja exatamente ao contrário.
Parabéns Davis.
Recado bem dadíssimo.Irretocável. O que subjaz, ou o cerne da questão é, de fato:
"Não é de hoje que temos uma sociedade racista, excludente, sectária, elitista e violenta. Nada na vida é à toa. Tudo tem um por quê. E o nosso problema é porque não tratamos, de maneira adequada e inteligente, dos escravos que se tornaram oficialmente “cidadãos”, após o fim da escravatura, mas não obtiveram as condições de logística e de empregabilidade para tocarem a vida, o que significou o abandono de milhões de pessoas, que passaram a ocupar os guetos, as periferias e os morros — as chamadas comunidades, termo que tenta amenizar e esconder, hipocritamente, a palavra favela.A violência policial está intrinsecamente ligada à escravidão." O que é mais interessante ou sintomático, é que provavelmente a maioria do policiais seja igulamente de pobres e de pretos, com todo respeito.
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